terça-feira, 28 de julho de 2009


Mar

Mistério amor recôndito. Mar... essa palavra exppresa com leviandade, quase sem noção da sua força, da sua potência exposta na nossa vida.
Casa da natura, com ondas de viagens oceânicas onde a vida acontece nos silêncios da cumplicidade dos seus habitantes diversos...
Magia... das dispersas fontes de inspiração dos azuis sobrepostos. Cores desenhadas.
Areias... que sustentam um mundo escondido em segredos protegidos e proibidos.
Respeito... que as alternâncias impõem. Que as intempéries provocam...
Deste lado, em terra firme, sempre que posso vou visitar-te para acalentar a minha saudade, para sentir a tua mensagem...
Depois, depois volto às aventuras do quotidiano mais preperado e com maior capacidade para entender a vida, sempre pronto para voltar para perto de ti!
Difícil de entender... difícil de explicar esta nossa relação desconhecida...

(Palavras escritas por Paulo Afonso Ramos sobre o "meu" mar, o "nosso" mar...)

domingo, 26 de julho de 2009

Não sei como dizer-te

Não sei como dizer-te que a minha voz te procura
e a atenção começa a florir, quando sucede a noite
esplêndida e casta.
Não sei o que dizer, especialmente quando os teus pulsos
se enchem de um brilho precioso
e tu estremeces como um pensamento chegado. Quando
iniciado o campo, o centeio imaturo ondula tocado
pelo pressentir de um tempo distante,
e na terra crescida os homens entoam a vindima,
– eu não sei como dizer-te que cem ideias,
dentro de mim, te procuram.

Quando as folhas da melancolia arrefecem com astros
ao lado do espaço
o coração é uma semente inventada
em seu ascético escuro e em seu turbilhão de um dia,
tu arrebatas os caminhos da minha solidão
como se toda a minha casa ardesse pousada na noite.
– E então não sei o que dizer
junto à taça de pedra do teu tão jovem silêncio.
Quando as crianças acordam nas luas espantadas
que às vezes caem no meio do tempo,
– não sei como dizer-te que a pureza,
dentro de mim, te procura.

Durante a primavera inteira aprendo
os trevos, a água sobrenatural, o leve e abstracto
correr do espaço –
e penso que vou dizer algo cheio de razão,
mas quando a sombra vai cair da curva sôfrega
dos meus lábios, sinto que me falta
um girassol, uma pedra, uma ave – qualquer
coisa extraordinária.
Porque não sei como dizer-te sem milagres
que dentro de mim é o sol, o fruto,
a criança, a água, o deus, o leite, a mãe,
o amor,

que te procuram.

(Herberto Helder)

quinta-feira, 23 de julho de 2009


A arte de ser feliz

Houve um tempo em que minha janela se abria
sobre uma cidade que parecia ser feita de giz.
Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco.

Era uma época de estiagem, de terra esfarelada, e o jardim parecia morto.
Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde, e, em silêncio,
ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas.
Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse.
E eu olhava para as plantas, para o homem,
para as gotas de água que caíam de seus dedos magros
e meu coração ficava completamente feliz.

Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor.
Outras vezes encontro nuvens espessas.
Avisto crianças que vão para a escola.
Pardais que pulam pelo muro.
Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais.
Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar.
Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega.
Às vezes, um galo canta.
Às vezes, um avião passa.
Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino.
E eu me sinto completamente feliz.

Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas,
que estão diante de cada janela,
uns dizem que essas coisas não existem,
outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente,
que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.

(Cecilia Meireles)

segunda-feira, 20 de julho de 2009


Lua Nua...

Noite escura
na terra de ninguém
onde os caminhos se escondem…
Noite de outrem
que sempre dura
na viagem de alguém…

Um rio calmo
em silêncio infatigável
visto do alto
pela lua grande
é terno
e acariciado
num caminho feito
para que possas passar…

Vejo o teu desenho
estampado no rosto desse rio
iluminado,
vejo esse corpo
que chega devagar…

Vejo o preto da noite
e o branco do teu amor!

Resta-nos a cor
rosa…
roubada no canteiro
da nossa dor!

(Paulo Afonso Ramos)

domingo, 19 de julho de 2009

a palavra na ausência

de que valem as palavras,
quando tudo não faz sentido?
de que vale uma memória,
que se alimenta do que é já perdido?

nos mais ínfimos gestos,
reconheço em ti o corpo
do meu amor mais profundo.
e na tua voz,
declamados,
ouço os poemas todos do mundo

mas há tanto que te aguardo,
na ponta do desespero...
esse limbo, entre o sonho e a realidade,
onde em vão que por ti espero!

e a tua ausência
já se faz maior que tudo
de nada me vale
o efémero que entre nós havia
amo-te num grito mudo
amordaçado...
num absorto lirismo de poesia.

(Leal Maria)

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Identidade

Preciso ser um outro
para ser eu mesmo

Sou grão de rocha
Sou o vento que a desgasta

Sou pólen sem insecto

Sou areia sustentando
o sexo das árvores

Existo onde me desconheço
aguardando pelo meu passado
ansiando a esperança do futuro

No mundo que combato morro
no mundo por que luto nasço

(Mia Couto)

quinta-feira, 9 de julho de 2009


Dono do Mundo


Procurei o dono do mundo
queria saber quem manda
na alegria
na emoção contida
na razão
na ilusão de cada dia…
Queria conhecer
tão poderoso
que comanda a vida
que decide entre o sim e o não…
E os caminhos que percorri
levaram-me
(a pergunta)
trouxeram-me
(a resposta)
na simplicidade das coisas
descobri…
O dono do mundo
é o coração
mas quem manda aqui
é o pensamento
que compõe o querer
de cada um…

Em cada coração
em cada pensamento
entre muitos, corpos
há um dono do mundo…

(do seu mundo…)


(Paulo Afonso)

domingo, 5 de julho de 2009


Nega-me o pão, o ar

Nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.

(Pablo Neruda)

sábado, 4 de julho de 2009

Deixas em mim tanto de ti

Deixas em mim tanto de ti

Deixas em mim
aureolas de ti... e é tanto
deixas assim
um manto
que me cobre de espanto.

O aroma do teu corpo sedento
o traço do teu sentimento
um olhar lírico
desse teu querer idílico.

Deixas em mim tanto de ti
que nas tuas ausências me afaga
acalenta cada momento que não te vi
aquece o amor que tempo não apaga
no calor que a distância agarra.

(Paulo Afonso Ramos)