quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Até Amanhã

Sei agora como nasceu a alegria,
como nasce o vento entre barcos de papel,
como nasce a água ou o amor
quando a juventude não é uma lágrima.

É primeiro só um rumor de espuma
à roda do corpo que desperta,
sílaba espessa, beijo acumulado,
amanhecer de pássaro no sangue.

É subitamente um grito,
um grito apertado nos dentes,
galope de cavalos num horizonte
onde o mar é diurno e sem palavras.

Falei de tudo quanto amei,
de coisas que te dou
para que tu as ames comigo:
a juventude, o vento e as areias.

Eugénio de Andrade, in  "Até amanhã"