segunda-feira, 19 de outubro de 2009

junto pedaços de mim

ando por aqui a juntar pedaços de mim
nuvens coçadas que se movem desencontradas
folhas tobam das árvores chorando devagarinho
há dias e noites em que nada acontece nada há
apenas murmúrios insidiosos de vozes ausentes
o meu corpo apenas um braço áspero de sal
ando por aqui a juntar pedaços de mim
silêncios magoados de passados amarrotados
um mundo de injusta tristeza de meninos
barcos à deriva na crista selvagem das ondas
nesta embriaguez de sentimentos que me assolam
onde me perco tantas vezes sendo outra coisa
o meu eu decalcado vezes sem conta
se ao menos o mar se prolongasse dentro de mim
não quero ser barco sujo no significados das palavras
ando por aqui a juntar pedaços de mim
um vazio atravancado de pessoas e vidas
teclas brancas e negras de um piano autero
composições ausentes de formas lúcidas
condenado à ausência da normalidade
vagueio marginal atolado em todas as dores
gritos agudos que me ferem de revolta
ando por aqui a juntar pedaços de mim

(António Paiva)

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